Ao entrar na Apollo 11, um ano antes da invenção dos microcomputadores, Michael Collins, Buzz Aldrin e Neil Armstrong realizavam um sonho que sempre acompanhou a humanidade. Desbravar o espaço, ultrapassar os limites da Terra e até, quem sabe, dar de cara com alguma forma de vida eram desejos antigos, expressos em diversas culturas do Ocidente e do Oriente. Mais próximo objeto extraterrestre, a Lua exercia um fascínio especial e praticamente todas as sociedades têm mitologias associadas a ela.
Curiosamente, o século 20 não começou tão atento ao satélite. “Naquela época, os astrônomos estavam interessados apenas em objetos fora do nosso Sistema Solar. Eles viam a Lua como uma amolação que iluminava o céu noturno, dificultando o estudo das estrelas e galáxias mais fracas”, contou, por meio da assessoria de imprensa do Instituto de Ciência Planetária, em Tucson, William Hartmann, o astrônomo e divulgador científico foi um dos primeiros alunos de pós-graduação do célebre cientista norte-americano Gerard Kuiper, considerado o pai da ciência planetária moderna.
Ao contrário da maioria dos astrônomos da época, o grupo liderado por Kuiper na Universidade do Arizona não só se interessava pela Lua como produziu, a partir de fotos, os primeiros atlas lunares. Essas publicações ajudaram a Agência Espacial Norte-Americana (NASA) a compreender a geologia do satélite e a escolher os melhores locais para as sondas e, futuramente, os homens pousarem nas missões Apollo.
Naquele fim de década, o espaço já não era algo tão novo para o homem. Oito anos antes, o cosmonauta russo Yuri Garagin tomava para si o título de primeiro homem a sair da Terra. Em plena Guerra Fria, os Estados Unidos não podiam ficar para trás. A corrida espacial começou, oficialmente, em 4 de outubro de 1957, quando a ex-União Soviética lançou o Sputnik 1, levando a NASA a desenhar um programa muito mais ousado.
Os norte-americanos não apenas ultrapassariam a fronteira terrestre, mas deixariam pegadas na Lua. “Enviar uma missão tripulada era muito mais pelo glamour do que pela validade científica”, explica o astrônomo Naelton Mendes de Araújo, do Planetário do Rio de Janeiro. “As sondas automatizadas são muito mais rápidas, seguras e baratas. Por isso, o voo tripulado foi muito mais por política que por ciência”.
Antes de enviar Collins, Aldrin e Armstrong para a Lua, a NASA preparou três missões não tripuladas: Ranger, Surveyor e Lunar Orbiter. Entre 1961 e 1965, nove sondas Ranger foram lançadas. A primeira bem-sucedida foi a 7, que partiu em 28 de julho de 1964, pousou na planície Mare Congitum, ao sul da cratera Copernicus, e, de lá, mandou mais de 4,3 mil fotos para a Terra.
Em fevereiro do ano seguinte, a Ranger 8 alunissou no mesmo lugar que os astronautas da Apollo 11 deixariam suas pegadas: o Mar da Tranquilidade. A última nave Ranger foi lançada em março de 1965 e enviou 5,8 mil novas imagens desde a cratera Alphonsus. Trabalhadas na Universidade do Arizona, essas fotografias foram a base dos atlas produzidos pela equipe de Gerard Kuiper.
Entre 1966 e 1968, cinco de sete missões Surveyor foram bem-sucedidas e, além de mais de 90 mil fotos, realizaram experimentos, examinaram o solo lunar abaixo da superfície e identificaram a composição mineral de alguns pontos da Lua. Uma das principais descobertas — por sinal, muito mais importante do ponto de vista científico do que qualquer realização da Apollo 11 — foi a existência de basalto, indicando que, no início da história do satélite, a formação das grandes crateras levou ao derretimento de material do interior da Lua, o que deflagrou violentos vulcanismos.
O mapeamento completo do satélite, um passo essencial para enviar uma missão tripulada, ocorreria com a Lunar Orbiter, que, entre 1966 e 1967, investigou detalhadamente a topografia e a geologia de diversos tipos de terrenos lunares com objetivo de encontrar o local mais apto para a alunissagem da Apollo. Com tantas informações nas mãos, a NASA marcou a data de lançamento da esperada ida do homem à Lua.
Neil Armstrong, o comandante, Buzz Aldrin, o piloto do módulo lunar, e Michael Collins, o piloto do módulo de comando, partiram da Terra em 16 de julho de 1969 no topo do lendário foguete Saturno V sem saber se voltariam vivos. “Havia numerosas incertezas, por isso todo mundo envolvido só podia considerar a missão um sucesso quando ela terminasse”, afirmou a NASA por meio de sua assessoria de comunicação. Mas deu tudo certo e há exatos 50 anos, em 20 de julho de 1969, o módulo Eagle pousou no Mar da Tranquilidade.
Mesmo com o viés político que ofuscava os objetivos científicos do programa, as missões Apollo se tornaram um dos momentos mais prolíficos na história da ciência. Não é exagero dizer que quase tudo o que sabemos sobre o Sistema Solar foi descoberto graças a essas expedições.
Nossa visão da Lua mudou profundamente. Se antes ela era tida como um objeto primordial de origem e estrutura incertas, passou a ser vista como um mundo complexo, não tão diferente da Terra em vários pontos. Dona de um passado geológico bastante ativo (entre 4,6 e 4,4 bilhões de anos atrás, era coberta por um profundo oceano de magma), seu material rochoso já foi derretido, entrou em erupção através de vulcões e foi esmagado por impactos de meteorito repetidas vezes.
Como evoluiu sob a influência gravitacional terrestre, tornou-se um pouco assimétrica. Sua superfície é coberta por uma grossa camada de poeira e fragmentos de pedra: o regolito lunar. Ele preserva um registro químico único de 4 bilhões de anos de radiação solar — importante para entender mudanças climáticas na Terra.
Ao estudar a Lua, os cientistas se sentem como paleontólogos espaciais: as rochas lunares mais jovens têm a mesma idade que as terrestres mais velhas. Aqui, a tectônica de placas e a erosão estão sempre modificando as superfícies mais antigas. Na Lua, elas permanecem intocadas. Estudos sobre as rochas de lá e de cá também deixaram claro que as composições são bem parecidas. Portanto, a Terra e seu satélite natural têm uma origem comum. Mas há um ponto em que são muito diferentes: muito já se testou à procura de sinais de vida, passada ou presente, nas amostras lunares e nada foi encontrado.
Apollo, o deus do Sol
Em um fim de tarde em 1960, enquanto folheava um livro de histórias mitológicas em sua casa, o diretor de programas de voo espacial da NASA impressionou-se com uma figura. Ela mostrava um dos deuses mais reverenciados da Grécia Antiga em todo o seu esplendor. “Apollo conduzindo sua carruagem através do Sol era apropriado à grandeza da escala do programa proposto”, explicou futuramente Abe Silverstein. Foi ele quem abriu o precedente de dar nomes de deuses e heróis aos projetos espaciais tripulados, com o pioneiro programa Mercury, de 1958.
Apollo era o deus do arco e flecha, da profecia dos oráculos, da poesia e da música, da dança, do conhecimento, da cura e, acima de tudo, da luz e do Sol. Todos os dias ele montava em sua carruagem dourada e puxava o Sol em seu caminho pelo céu.
Mas por que, afinal, o nome das primeiras missões tripuladas à Lua foi inspirado pelo deus do Sol? É que, quando pensou no nome, Silverstein ainda não sabia que o destino final do programa seria a superfície lunar. Até então, trabalhava-se com a ideia de uma continuidade aos voos espaciais com astronautas. Não sabia-se ao certo para onde.
Futuro das Missões
Desde então, apenas um clube pequeno de países foi capaz de percorrer os 384 mil quilômetros de distância e pousar sondas na superfície árida do satélite da Terra. Além dos Estados Unidos e da União Soviética, hoje Rússia, só a China conseguiu. A União Europeia, o Japão e o Índia também chegaram lá, mas sem um pouso controlado.
A Lua sempre foi um objetivo. Mas, como o topo de uma montanha, apenas chegar lá justificava o esforço. Só que, na nova fase da exploração espacial, as empresas privadas, que são as grandes protagonistas, não querem a aventura pelo espírito da aventura. A ambição é maior, envolve as riquezas da Lua.
“Nós voltaremos à Lua para ficar. Vamos com os nossos parceiros internacionais e vamos usar os recursos da Lua. Já descobrimos centenas de milhões de toneladas de gelo no polo sul da Lua. Isso é água para beber, é ar para respirar, e hidrogênio e oxigênio também são combustível para foguetes”, explicou Jim Bridenstine, administrador da Agência Espacial Americana.
No início de 2019, a NASA anunciou o programa Artemis, nome da irmã gêmea do deus Apollo na mitologia grega. A meta é levar astronautas à Lua até 2024. O projeto prevê uma estação de abastecimento na órbita da Lua.
A NASA vai coordenar o projeto dessa estrutura chamada Gateway, ou Portal, e quer que a iniciativa privada, além de construir partes da estação, fique responsável pelo transporte entre o Gateway e a superfície lunar.
“Um dos maiores objetivos da Nasa hoje é ajudar a indústria comercial a crescer e se desenvolver para fazer parcerias”, afirmou o gerente de logística do projeto Gateway.
Quem aposta mais alto nessa estratégia são indivíduos com capacidades empresariais comprovadas, egos enormes e muito dinheiro. Elon Musk, dono da montadora de automóveis elétricos Tesla, fundou a Space X; e Jeff Bezos, o dono da Amazon e o homem mais rico do planeta, criou a Blue Origin. As duas empresas já têm contratos com a NASA.
Naquele 20 de julho de 1969, um quarto da humanidade acompanhou, ao vivo, pela TV e pelo rádio, o comandante da missão Apollo 11 descer as escadas do módulo lunar. Neil Armstrong entrou para a história ao declarar: “Este é um pequeno passo para o homem, um grande salto para a humanidade”.
Cinquenta anos depois, o plano de pousar seres humanos na Lua até 2024 é apenas mais um passo na direção de um outro grande salto para a humanidade: a conquista de Marte.